O texto descorporificado
Neste tópico, iremos explorar conceitos materiais de texto digital que, como vou sugerir, nos permitirão entender com maior profundidade as consequências das tecnologias computacionais para o trabalho filológico (e, paralelamente, também para o trabalho com o texto em algumas linhas da linguística).
Essencialmente, examinaremos os conceitos do texto como algoritmo (Eggert, 2010), do texto descorporificado (Paixão de Sousa, 2013), da redocumentarização (Pédauque, 2004 e outros), e da anotação textual como representação do conhecimento (Unsworth, 2004 e outros), e exploraremos suas consequências para o trabalho filológico.
Nesse exame conceitual, partiremos de um fato central e inescapável: o ‘texto’, no meio digital, é materialmente, uma fórmula matemática que representa um texto.


Em seguida, irei sugerir que esta contingência material do texto digital, longe de limitar o trabalho filológico, liberta-o.
Nisso, seguiremos a seguinte observação de A. Emiliano:
As tecnologias da informação põem hoje à disposição dos filólogos variadíssimos recursos (aplicações, utilitários, redes, suportes para armazenamento de grandes quantidades de texto) para editar, processar e analisar textos medievais. A representação tipográfica de textos medievais é uma das áreas que sofreu grandes avanços nas últimas décadas, com o desenvolvimento da tecnologia tipográfica digital, com o estabelecimento de diversas normas internacionais para representação de caracteres de escrita, e com o surgimento e desenvolvimento de aplicações de linguagens de anotação (“markup languages”). Estes desenvolvimentos e avanços interpelam decisivamente os filólogos portugueses, que são obrigados a repensar os procedimentos e estratégias editoriais praticados até o advento e generalização do computador pessoal: não é possível continuar a pensar as edições como objectos fechados e fixados imutavelmente na página impressa em papel, ou como simples transposições dos textos medievais para o suporte impresso através da utilização do escasso número de caracteres contido na versão moderna do alfabeto romano.
António Emiliano, Tipo Medieval para Computador: uma ferramenta informática para linguistas, historiadores da língua e paleógrafos, 2005. Meus grifos.

Ligações interessantes
Na investigação conceitual do texto sugerida para esta sessão, examinaremos também alguns projetos e trabalhos que exploraram com profundidade as possibilidades abertas pelas características materiais do texto digital, quebrando alguns paradigmas ligados à escrita manual e mecânica. Em particular, destacaremos projetos (e ferramentas) que abordam a análise e o tratamento da paleografia de documentos medievais e renascentistas:


Album interactif de paléographie médiévale | http://paleographie.huma-num.fr



‘Reconstrução’ paleográfica de um manuscrito do Livro de Exeter – Imagem 3 em Rambaram-Olm, 2015 | https://journal.digitalmedievalist.org/article/10.16995/dm.49/

Bibliografia específica
Para este tópico, examinaremos com particular atenção os seguintes itens da bibliografia sugerida (por favor, veja ali as referências completas):
Chaudiron, 2008; Clement, 2011; Eggert, 2010; Emiliano, 2005; Gillam, 2003; Gradmann & Meister, 2008; Lavagnino, 2007; Paixão de Sousa, 2009, 2013, 2014b; Pédauque, 2004, 2006, Rambaram-Olm, 2015; Salaün, 2007; Unsworth, 2004; Zöllner-Weber, 2009.